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OS CRÉDITOS representam a segunda forma de «ajuda» americana. Com a ajuda destes créditos os monopolistas dos Estados Unidos apertam cada vez mais o nó corrediço da dependência financeira dos países da Europa Ocidental.
Em geral, quando se firma um contrato sobre créditos, entre partes iguais em direitos, se estabelece de comum acordo a taxa do juro, os prazos e modalidades de pagamento da dívida. A situação manifestamente desigual dos credores americanos, de um lado, e, de outro lado, de seus devedores da Europa Ocidental está demonstrada especialmente no fato de que, até aqui, os países europeus ignoram o custo dos empréstimos e o modo de reembolso. Os credores americanos julgam inútil não só entrarem em acordo a este respeito com os governos europeus, como ao menos lhes darem a conhecer suas condições. Pois, de qualquer maneira, estas condições não podem ser discutidas ou alteradas! De qualquer forma que possam se apresentar mais tarde, os vassalos europeus deverão sofrer a vontade de seu soberano americano. Demonstração característica do feudalismo financeiro contemporâneo, que se constitui devido à decomposição cada vez mais avançada do regime capitalista!
Os textos dos acordos firmados a título do plano Marshall, entre os Estados Unidos e os países da Europa Ocidental, textos agora publicados, contêm materiais abundantes que permitem definir as formas mais recentes das relações extra-econômicas de domínio e sujeição sobre que repousa o capitalismo monopolista de nossa época.
Tomemos, por exemplo, o acordo com a França, cujas cláusulas são igualmente típicas para os outros países.
No artigo primeiro, já este acordo prevê que as compras de produtos a efetuar pela França, fora do território dos Estados Unidos, não devem prejudicar os interesses comerciais destes. Baseando-se nesta cláusula, os monopolistas americanos podem proibir à França o comércio com qualquer outro país. Não é por acaso que a imprensa francesa divulga que os americanos forçam a compra de carvão ao preço de 20 dólares a tonelada, quando os franceses poderiam obtê-lo à razão de 12 dólares.
O artigo 2 do acordo estipula que os produtos fornecidos a titulo deste acordo devem ser utilizados para os fins correspondentes ou para fins especiais que possam ser admitidos pelo governo dos Estados Unidos. Isto significa que Washington pode, a qualquer momento, prescrever ao governo francês para utilizar determinado artigo de importação, por exemplo, o próprio carvão, com um fim expresso, digamos, para a produção de armamentos e de material de guerra.
Em seguida, o acordo prevê que a França deve fornecer aos Estados Unidos as matérias primas estratégicas que lhes são necessárias. Desta forma as reservas de bauxita, petróleo, níquel e cromo existentes no território da França ou nas possessões do ultramar são, de fato, colocadas à disposição absoluta e sem partilha de Washington.
O artigo 6 obriga o governo francês a assegurar uma proteção bastante ampla a todos os cidadãos dos Estados Unidos, em qualquer companhia sociedade ou associação criada de acordo com as leis americanas. Deve lhes garantir o acesso à exploração dos recursos franceses em igualdade de direitos com os cidadãos franceses.
Os povos europeus sabem já muito bem que a exigência americana de «possibilidades iguais» corresponde a pedir uma liberdade completa da expansão econômica e política dos monopólios da América. Hoje, isto é exigido dos países da Europa. Na França, por exemplo, as companhias americanas organizadas nos termos do artigo 6 do acordo podem facilmente esmagar seus concorrentes franceses graças à superioridade imensa de seus meios financeiros. É com absoluto conhecimento de causa que os meios progressistas franceses protestam contra as cláusulas do acordo, declarando que se trata de um «acordo sobre a colonização da França».
O artigo 8 obriga o governo francês a dar aos Estados Unidos informações sobre a economia e quaisquer outras. Assim a França é obrigada a comunicar aos americanos toda a espécie de informações de ordem econômica, inclusive os segredos de fabricação. Por outras palavras, o acordo abre completamente a porta da França a uma espionagem econômica de grande envergadura. E o governo francês está não só impedido de tomar medidas contra esta espionagem, mas ainda deve lhe prestar toda sua ajuda e concurso.
Assinalemos, como fato de grande significação que já em meados de junho de 1948, a revista «Finanstidende», órgão dos meios financeiros dinamarqueses que tentam fazer objeção à espionagem econômica americana ligada ao plano Marshall, escrevia:
«O que inquieta é a extrema curiosidade demonstrada pelas comissões encarregadas do controle da ajuda americana. Os ministérios europeus dos negócios estrangeiros e os serviços administrativos estão a tal ponto ocupados em preencher os questionários americanos de toda a espécie que não lhes sobra tempo para outros trabalhos».
Os jornais de muitos países da Europa Ocidental falam de questionários dirigidos pelas missões americanas a diversas empresas convidando as mesmas a comunicar as informações mais detalhadas sobre o tipo de sua atividade industrial e comercial.
O artigo 9 do acordo com a França prevê para os cidadãos americanos que têm interesses nesse país a compensação dos prejuízos decorrentes de medidas governamentais que possam afetar seus bens ou interesses. Os americanos obtêm assim um motivo legal de ingerência em toda a questão da política econômica francesa. Terão especialmente a possibilidade de impedir a nacionalização de qualquer ramo da indústria onde podem criar em pouco tempo seu próprio lar.
Finalmente têm uma importância especial as cláusulas (incluídas em todos os acordos) que levam os governos dos países europeus a ampliar o regime da nação mais favorecida não só aos Estados Unidos como ainda a todos os territórios ocupados por estes, isto é, à Alemanha Ocidental, ao Japão e à Coréia.
Esta cláusula levantou em numerosos países, sobretudo na Inglaterra e. na Franca, uma verdadeira tempestade de indignação. Nada existe de extraordinário nesse fato, pois, esta determinação do acordo obriga a França, a Inglaterra e outros países europeus a contribuírem de todas às formas para o reerguimento prioritário da economia dos antigos países inimigos. Trata-se, como todos sabem, não do reerguimento econômico pacífico, mas de restabelecer a base econômica da agressão, ou seja o potencial da industria de guerra. Isto porque nenhuma garantia é dada contra o renascimento das forças de agressão do imperialismo alemão e japonês. Pelo contrário, toda a orientação da política americana nestes antigos países inimigos contribui para o reerguimento mais rápido de suas forças imperialistas e agressivas.
Compreende-se à luz dos fatos precedentes, que o Bureau dos estudos econômicos da CGT francesa tenha qualificado o famoso acordo sobre o plano Marshall de domínio pelos americanos do controle efetivo da política financeira e monetária francesa.
Tais são os acordos chamados bipartites que, segundo a observação irônica de um jornal francês, seria mais justo chamar unipartites. Com efeito, estes acordos foram elaborados por Washington e, em seguida, pura e simplesmente impostos aos governos da Europa Ocidental.
Durante os recentes debates sobre estes acordos nos parlamentos dos países europeus (depois de já assinados pelos governos) os campeões do plano Marshall usaram toda espécie de artifícios na tentativa de embelezar a triste realidade. Por exemplo, a 3 de julho de 1948, na sessão do Storting norueguês, Lange, ministro dos Negócios Estrangeiros, fez considerações no sentido de que toda cooperação internacional comporta, inevitavelmente, prestar atenção, a perda, da soberania nacional. Mas este sofisma não poderia encobrir um fato inegável, isto é, que a cooperação de partes iguais em direitos difere por completo da «cooperação» do cavalo e do cavaleiro e, ainda, mais, da cooperação da jibóia e do coelho que aquela engole.
O plano Marshall é uma tentativa de criar um gigantesco monopólio de Estado para a exportação de capitais americanos para os países da Europa. Os empréstimos sob o titulo de plano Marshall que excluem de fato o afluxo de investimentos a longo prazo e créditos a curto prazo assentam sobre uma base comercial normal. Em compensação, o mecanismo do plano freia o caminho da colocação de capitais americanos na base da colonização dos países europeus. Trata-se da expansão dos monopólios de Wall Street em condições aproximadamente: semelhante às que existem na América Latina ou no Oriente Médio. Mas a Europa Ocidental, por muito baixo que tenham caído as forças governamentais, política e moralmente, não é o Paraguai nem a Arábia Saudita. Esta é uma das contradições profundas do plano Marshall, que aliás está todo crivado de contradições.
O monopólio de exportação de capitais americanos para os países da Europa, monopólio estabelecido pelo plano Marshall, torna ainda mais desfavorável a correlação das forças entre o credor que ocupa a situação dominante, de um lado, e do outro os devedores, subjugados e humilhados. Os créditos são concedidos em condições econômicas que impedem por si próprias, de todas as formas, os países devedores a levantarem realmente sua economia nacional, o que lhes teria permitido mais tarde se libertarem de suas dívidas. Trata-se de créditos escravizadores. Ao mesmo tempo, o plano Marshall é incapaz de vencer ou mesmo atenuar o efeito das leis espontâneas do capitalismo. Ora, estas leis levam inevitavelmente a uma nova acentuação da desigualdade do desenvolvimento dos países capitalistas, a novas modificações na correlação das forças.
Inclusão | 28/03/2008 |