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A PRINCÍPIO os adeptos do plano. Marshall rejeitavam com fingida indiginação as advertências dos que diziam que este plano comporta uma ameaça mortal à soberania econômica dos países da Europa Ocidental. Hoje, a existência desta ameaça é um segredo de polichinelo. Num ano viu-se acumular uma multidão de fatos que desmascaram o plano Marshall como programa de escravização econômica do Oeste europeu pelos monopolistas da América. Atualmente, mesmo os advogados mais fervorosos do plano Marshall são obrigados a reconhecer afinal de contas que o dito plano torna bem duvidosa a independência econômica dos países que nele tomam parte.
Por exemplo, o jornal conservador inglês «Evening Standard» manifestava desde janeiro de 1948, em termos claros, a apreensão de que «a soberania econômica seja trocada por uma omelete de ovos em pó».
Agora que são conhecidas as condições da famosa ajuda americana, estas confissões involuntárias são cada vez mais freqüentes. A 20 de junho o jornal inglês «Sunday Times» lamentava-se amargamente de que os acordos propostos conferirão de fato, à América, o controle econômico da Europa Ocidental e «privilégios especiais que nada justifica». No dia seguinte o «Combat», falando das negociações de Washington a respeito das condições da ajuda americana, também reconhecia que se tratava menos de um problema técnico do que da submissão aos Estados Unidos da vida econômica dos vários países europeus.
No mesmo dia o correspondente da agência Reuter telegrafava de Paris.
«Os meios franceses responsáveis consideram que certas cláusulas do acordo colocariam sob a dependência do capital americano todas as novas empresas francesas que utilizam os materiais recebidos de conformidade com o programa de ajuda à Europa».
Estas confissões e semiconfissões involuntárias multiplicam-se diariamente.
Os meios dirigentes da Europa Ocidental não quiseram escutar a União Soviética quando os advertia de que se os povos da. Europa queriam realmente fazer renascer sua economia, deviam contar em primeiro lugar com seus próprios esforços. Na hora atual a justeza desta advertência é reconhecida por confissões um pouco tardias. Por exemplo, a 12 de junho, o «Financial Times», órgão dos círculos de negócios ingleses, escrevia:
«A Europa fará bem em não contar demasiadamente com a ajuda americana, que pode repentinamente acabar. Por paradoxal que isto pareça, pode se dizer que quanto maior for a realização da Europa no domínio do reerguimento econômico, por seus próprios esforços, mais os americanos estarão dispostos a ajudá-la».
É caso de perguntar a razão por que os sócios europeus de Washington, mudos há tanto tempo, recuperaram de repente a voz. A razão é esta: durante o ano que acaba de passar, muitas coisas que, anteriormente se escondiam com cuidado, surgiram nitidamente. Em presença dos fatos, o silêncio torna-se por vezes impossível mesmo para aqueles que se entregaram de corpo e alma ao dólar.
Os monopolistas americanos e seus homens de confiança cada vez fazem menos cerimônia com seus clientes da Europa e, freqüentemente, põem os pés sobre a mesa. Isto ressaltou em especial durante os debates sobre o plano Marshall, conduzidos lentamente nas comissões do congresso americano.
Hoffman, administrador do plano Marshall, ao tomar a palavra a 13 de maio na comissão senatorial dos créditos, declarou;
«Assemelhamo-nos a um banqueiro. Podemos dizer que não daremos nossos dólares se vocês não fizerem estas ou aquelas coisas».
«Estas ou aquelas coisas», na rica linguagem de Paul Hoffman, compreendem, conforme o demonstra a experiência do tempo decorrido, exigências econômicas e políticas muito variadas: desvalorização do franco e bases militares na Groelândia; o diktat de Londres prescrevendo o desmembramento da Alemanha e a renúncia da Inglaterra ao bloco da libra esterlina; manutenção de um bando de conselheiros americanas na Turquia e participação no bloco militar ocidental, etc. A alegação de Hoffman a respeito do papel de banqueiros não engana mais: nas condições atuais, o banqueiro não impõe semelhantes exigências ao devedor. Mas o fato é que, de modo exato, Washington de nossos dias não age como o banqueiro que empresta em condições comuns. Hoje, Washington desempenha o papel do usurário mundial que exige, em troca dos seus dólares, uma submissão econômica e política total dos países que participam do plano Marshall.
No início de maio, durante uma entrevista com James Brough, correspondentes do «Daily Mail» em New York, Hoffman desvendou um pouco seus objetivos em relação à Inglaterra. Depois de ter notado que Hoffman controlará mais de um terço das importações inglesas, o correspondente cita a declaração seguinte do entrevistado:
«Considero que será apresentado um plano que mostrará que os dólares americanos são investidos numa obra de reerguimento da Inglaterra na base de princípios de negócios sãos e firmes. Conto ver aplicar os princípios que aplicarei em minhas próprias empresas particulares. Conto também que os dirigentes ingleses apresentarão regularmente relatórios referentes aos êxitos obtidos em matéria de reerguimento».
Há algumas décadas atrás os usurários não se permitiam semelhante atitude a não ser com a Turquia dos sultões, esse «homem enfermo» da Europa. Hoje, falam desse jeito aos representantes da orgulhosa Albion. Realmente, passou os limites!
Os monopolistas americanos olham os países da Europa Ocidental como falidos a quem se deve ensinar a viver. Para Hoffman os princípios que usa nas suas próprias empresas são o máximo da sabedoria. O senador Capehart deu prova de maior largueza de vistas. Por ocasião dos debates sobre o plano Marshall no Senado, em março de 1948, declarou que se devem ensinar aos europeus os métodos americanos de direção dos negócios; que devem assimilar o «sistema americano» em seu conjunto. Por outras palavras, deve ser ensinado aos países da Europa Ocidental, pouco esclarecidos, não só os princípios de Hoffman, como também os de Ford, Morgan, Rockefeller, Du Pont e outros financistas e magnatas dos trustes da América.
Será um erro supor que os pais conscritos de Washington sonham apenas ensinar os cidadãos da Europa. Os senadores americanos, espíritos universais, não deixam também de se ocupar do aperfeiçoamento espiritual da população rural do Oeste europeu. Por exemplo, o bravo republicano Young, senador de Dakota-Norte, tomando a palavra em maio último na comissão senatorial dos créditos, propôs que os Estadas Unidos enviassem especialistas para ensinar aos camponeses franceses os bons métodos da economia rural. De passagem, este homem experimentado manifestou a opinião de que os franceses devem, em sua alimentarão, substituir a manteiga pela margarina. Não se pode negar ao sr. Young a lógica. De fato, desde que se propõe aos americanos canhões em vez de manteiga, por que não exigir que os franceses substituam a manteiga pela margarina?
Em fins de janeiro de 1948, Calder, presidente do comitê das relações internacionais da Associarão Nacional dos Industriais, tomou parte nos debates sobre o plano Marshall na comissão dos negócios estrangeiros do Senado. Declarou sem preâmbulos que a «ajuda» americana não deve ser concedida se este ou aquele país não renunciar a «um programa de novas nacionalizações e a planos que causariam prejuízo à iniciativa privada, baseada na livre concorrência». Segundo Calder, a «ajuda» dos Estados Unidos, nos países estrangeiros, deve ser dada, tanto quanto possível, a firmas particulares, e não aos governos ou organismos governamentais».
Este representante da Associação Nacional dos Industriais, considerada nos Estados Unidos como o governo de fato, expôs francamente o que os tubarões das finanças de Wall Street esperam do plano Marshall.
Calder declarou que a «ajuda» americana não deve ser concedida aos Países «que não dêem bastante garantia de uma atitude justa em relação aos investimentos de firmas americanas particulares nesses países ou suas possessões.» Não deve ser permitido aos países; da Europa Ocidental «sobrecarregar com impostos extraordinários, direta ou indiretamente, as exportações dos Estados Unidos ou os bens dos cidadãos americanos nos referidos países».
Por outras palavras, nada de nacionalização, nada de tentativas para coibir os apetites vorazes dos exploradores, isto de um lado, e do outro liberdade completa, para os negocistas americanos a fim de agirem à sua vontade nos países da Europa Ocidental, como na própria casa, pu talvez como em Nicarágua ou na Venezuela.
Este o conteúdo que os verdadeiros senhores dos Estados Unidos dão ao plano Marshall. E é este programa que, deve se reconhecer, guia os diplomatas do Departamento do Estado.
Inclusão | 28/03/2008 |