E agora?
O Proletariado na hora das grandes escolhas

Partido Revolucionário do Proletariado - Brigadas Revolucionárias


VII — AS TAREFAS IMEDIATAS


1. A CONTRA-INFORMAÇÃO
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Hoje os revolucionários encontram-se perante a invasão dos grandes meios de informação pela social-democracia. Poucos são os jornais diários onde se consegue fazer escorregar alguma informação revolucionária.

Os revolucionários e os trabalhadores em geral têm de recorrer aos métodos de agitação e propaganda próprios da classe explorada. Há no entanto que aproveitar esta legalidade que ainda é possível, para intensificar a agitação e propaganda com o à-vontade de quem o pode fazer à luz do dia. As sessões de esclarecimento, os debates, a imprensa revolucionária, os comunicados livremente distribuídos são neste momento uma oportunidade a aproveitar enquanto a burguesia não reorganiza o seu aparelho para reprimir, para proibir.

A agitação local à volta dos problemas e das necessidades dos trabalhadores, os jornais de parede, são neste momento, um instrumento precioso, quando se perdeu o acesso aos jornais diários e à Rádio.

Mas essa luta por uma informação e uma propaganda revolucionária pode ser um objectivo unitário. Pois a propaganda não é obrigatoriamente dum partido, mas deverá ser sim das ideias e objectivos revolucionários. Por isso essa tarefa pode ser levada a cabo por comités de unidade no local de trabalho ou local de habitação. Um comité de unidade pode fazer regularmente na fábrica ou no bairro um jornal de parede onde dê as informações que não vêm nos jornais, onde alerta para o perigo fascista, onde se desmascara a burguesia. À volta dessa tarefa podem juntar-se homens e mulheres de vários partidos e outros sem partido. É uma tarefa de unidade e é uma tarefa revolucionária.

2. O PODER POPULAR

O Poder Popular é a expressão pela qual se designa a organização autónoma dos trabalhadores. Ele inclui Comissões de Moradores, Comissões de Trabalhadores e Conselhos Revolucionários onde os houve. Mas acontece que os partidos reformistas (PCP e UDP), pela própria concepção que têm de partido, quiseram mais servir-se do Poder Popular do que servi-lo. Procuraram sempre que ele não fosse verdadeiramente autónomo (isto é, que a sua estrutura assentasse nas decisões de assembleia de base), mas sim que se moldasse às manobras, de acordo com as conveniências de momento.

O poder popular foi assim muitas vezes a capa que serviu para o fortalecimento dos partidos em causa ou então para ser instrumento da sua táctica.

Obedecer e dar contas à assembleia de fábrica ou de bairro foi método que se perdeu muitas vezes, sempre que essas organizações conseguiram dominar. Sobretudo nos bairros, as comissões de moradores funcionavam largo tempo sem convocar a assembleia de bairro pela qual tinham sido eleitas. Criaram-se secretariados e órgãos de coordenação sempre que isso foi necessário às manobras dos partidos. Certos órgãos de Poder Popular serviram para convocar e desconvocar manifestações, para escrever comunicados, para propor e pôr a falar oradores, sempre que os partidos necessitavam de o fazer e não queriam ou não podiam fazê-lo em nome do partido. Esses órgãos de Poder Popular afastaram-se das assembleias que os elegeram e tomaram posições para que não foram mandatados.

Por outro lado, foram usados para o folclore da «revolução portuguesa», para o espectáculo do activismo democrático.

Isto até ao 25 de Novembro. Depois disso o folclore foi passado pelo crivo e só ficou o que era verdadeiro. As comissões de moradores que estavam afastadas das suas bases acabaram por se isolar completamente e morrer de morte natural. O oportunismo e a manobra foram desmascarados em muito sítio. O controlo partidário diminuiu consideravelmente, mesmo nos locais onde a tendência dominante é reformista. Isto não quer dizer que em muitos locais as características anteriores não se mantenham, necessitando que se trave uma luta contra a manobra e contra o controlo.

E é necessário lembrar ainda que a maior parte dos órgãos de Poder Popular são órgãos reivindicativos e não órgãos directamente políticos. As comissões de moradores e sobretudo as comissões de trabalhadores têm apenas funções reivindicativas procurando ser a expressão das necessidades imediatas dos trabalhadores que representam. As comissões de trabalhadores têm na maior parte das vezes um carácter sindical, encarnando uma certa forma de realizar sindicalismo de empresa. São veículo das reivindicações dos trabalhadores daquela empresa, funcionando como o sindicato da empresa.

Raramente se elegeram órgãos de poder político, para o exercício do poder e para a organização armada. Essa era a proposta dos Conselhos Revolucionários. Essa é a concepção do poder dos conselhos ou sovietes, tal como também foi posta noutros locais e noutros momentos da História. E a Ditadura do Proletariado para ser a ditadura de uma classe inteira e não a ditadura de um partido, terá de ser baseada no poder dos Conselhos. Os órgãos eleitos nos locais de trabalho e nos locais de habitação para a conquista e o exercício do poder têm de ser órgãos directamente políticos. E a assembleia que os elege, tem de saber que está a eleger homens ou mulheres para exercerem determinadas funções, para serem responsáveis por armas, para serem delegados a um poder central. Se em Portugal o proletariado vier de novo para a rua, se a crise se agudizar, se o confronto se der, a constituição de Conselhos Revolucionários eleitos será decerto uma necessidade sentida pelas massas, que não confiam em deixar-se conduzir por direcções partidárias para as quais não meteram prego nem estopa.

Mas no momento imediatamente pós-eleitoral em que as grandes movimentações vão ter um carácter sobretudo reivindicativo, porque os trabalhadores não vão suportar o aumento do custo de vida, é natural que os actuais órgãos de Poder Popular assumam uma importância especial. As Comissões de Trabalhadores e as Comissões de Moradores vão ser o veículo da vaga reivindicativa que decerto vem aí. Muitas serão varridas e substituídas por outras que cumpram o papel que lhes é pedido. O processo esmagará os oportunismos e limpará o entulho. E a luta vai radicalizar esses órgãos reivindicativos e encaminhá-los para uma expressão política revolucionária anticapitalista, tal como aconteceu até ao 25 de Novembro ao Comité de Luta de Setúbal, formado a partir de Comissões de Trabalhadores e Comissões de Moradores.

3. A INDISPENSÁVEL UNIDADE

O 25 de Abril de 74, a par do desencadeamento de um processo de aceleração e aprofundamento da crise do capitalismo em Portugal, agigantou a necessidade de construção da alternativa revolucionária. Para quem possuía uma análise minimamente correcta da situação portuguesa, fácil era aperceber-se da inviabilidade de estabilização de uma democracia burguesa neste país e, logo, da colocação a curto prazo, da alternativa fascismo ou socialismo. Dado o reformismo do PCP, a questão de uma direcção política revolucionária, que subtraísse as classes trabalhadoras à influência desse partido, colocou-se cada vez com mais premência. E essa direcção política revolucionária não poderia surgir de um gabinete, ou da transposição mecanicista de outras situações concretas. Ela teria que surgir no decorrer do processo e intimamente ligada às necessidades, às aspirações e às lutas das classes trabalhadoras. Ela teria de ter a capacidade, não só de fazer propostas ao proletariado mas também de o orientar no sentido da saída revolucionária.

Por outro lado, a rapidez com que evolui a situação objectiva não se compadece com teorias como as que «adiam» a revolução para quando estiver construído ou reconstruído o «grande partido da classe». O confronto violento, a insurreição, a emancipação do proletariado não poderão estar dependentes de conceitos idealistas sobre a organização da classe e da sua vanguarda revolucionária. Portanto, há que encontrar formas que permitam solucionar este problema. E aqui se levanta a questão da unidade. Unidade da classe operária e das massas trabalhadoras nos locais de trabalho, unidade entre o proletariado urbano e o proletariado rural, unidade entre a cidade e o campo, unidade entre militantes revolucionários com e sem partido, unidade entre organizações revolucionárias.

No que diz respeito à unidade da classe nos locais de trabalho, ela forja-se na luta por objectivos concretos e imediatos (por aumento de salários, contra a repressão, por melhores condições de trabalho e de vida). É a unidade que se deve construir, acima dos interesses partidários, na luta pela organização autónoma da classe e pela tomada e exercício do poder pelos trabalhadores. É a unidade que deve ser conseguida nas Comissões de Trabalhadores, nos Conselhos de Aldeia, nos Conselhos Revolucionários e em outras estruturas democráticas de classe. E são numerosos os exemplos onde, de Norte a Sul do país, se encontram empenhados neste tipo de unidade militantes do PRP, do MES, da FSP, do PC, da UDP, alguns do PS e muitos militantes sem partido.

No que se refere à unidade entre militantes revolucionários, com e sem partido, trata-se de um nível também fundamental no momento presente. Se bem conduzida, ela irá retirar milhares de camaradas à instrumentalização dos partidos burgueses e reformistas e irá engrossar e solidificar as fileiras da vanguarda, vanguarda indispensável ao confronto violento e decisivo que se avizinha.

No que respeita à unidade entre o proletariado rural e o proletariado urbano, entre a cidade e o campo, há que reforçar os exemplos e as práticas concretas já verificadas, combatendo também aí, a instrumentalização partidária.

E há que organizar na prática a aliança operário-camponesa, isto é a ligação dos operários e os pequenos camponeses, encontrar formas de fazer compreender a estes que a revolução socialista é também para eles e não contra eles.

No referente à unidade entre organizações revolucionárias, trata-se de formas difíceis e, em alguns casos, pouco produtivas. Mas é possível e necessário estabelecer plataformas de acção comum, que não apenas barrem o caminho ao avanço do fascismo, mas contribuam para que o movimento de massas se lance ao ataque com firmeza no grande combate anticapitalista. O estabelecimento da plataforma de acção comum entre organizações revolucionárias, além de indispensável a uma mais correcta articulação das lutas nos seus vários níveis, poderá contribuir de forma importante para a unificação de uma vanguarda revolucionária e para a consequente resolução do problema da direcção política proletária. E, quanto mais desenvolvida estiver a unidade aos vários níveis, mais favoráveis serão as perspectivas e as possibilidades de vitória das forças revolucionárias.

4 — A GRANDE TAREFA — A INSURREIÇÃO ARMADA

Quando nós propomos a insurreição como única forma para a tomada do poder pelos trabalhadores, costumam-se levantar clamores pela esquerda revolucionária fora e temos sido chamados de «aventureiristas» e «esquerdistas» mesmo pelos aliados mais próximos. Continuamos à espera de saber qual é a «mesinha» que eles têm para os trabalhadores tomarem o poder sem insurreição... Se a têm, é melhor dizerem já, porque nós, apesar do símbolo do partido e da nossa fama guerreira não gostamos de mortos e feridos, sobretudo quando são do lado dos trabalhadores e nas nossas fileiras! Ou será que é melhor perguntar-lhes se querem mesmo a tomada do poder pelos trabalhadores?

Podem também pensar que a insurreição não é para já, porque a situação se vai aguentar neste impasse durante uns anos. Nós não pensamos isso. E fundamentamos a nossa maneira de pensar.

Em relação às eleições pensamos que são um bom caminho para o fascismo, mas que não servem para fazer a revolução. No entanto, somos atacados como exóticos porque não aparecemos nesta luta de clubes. Mas será exótica a grande parte do eleitorado que adoptou a abstenção?

E serão revolucionários muitos que se dizem revolucionários? Queremos todos a revolução, quando nos aliamos uns com os outros em nome da revolução?

Ou... haverá por aí senhores que andam a deitar contas se se hão-de meter ou não na revolução, conforme esta der ou não garantias de ser ganha?

Tudo isto tem a ver com o atraso das organizações revolucionárias em face da situação objectiva. Tudo isto tem a ver com o facto de não ter havido durante estes dois anos uma direcção revolucionária unitária que tivesse objectivos definidos, um programa, uma táctica. Chegar a acordo sobre uma manifestação, uma greve, um comunicado, não chega. A tomada do poder não se faz pela soma de manifestações, greves e comunicados. É preciso querer o mesmo, na mesma altura.

E nesse momento, em Portugal, a direcção político-militar unitária, revolucionária, não se pode fazer com um partido só.

Foi com estes problemas que nos debatemos ao longo destes dois anos. São estes problemas que tentamos resolver.

PORQUE É QUE DIZEMOS QUE A SITUAÇÃO NÃO SE AGUENTA NESTE IMPASSE

Baseamos esta nossa conclusão na análise económica da situação. Era possível prever em Abril de 74 que a situação portuguesa não ia estabilizar em democracia burguesa. Mas a maior parte das organizações que se dizem materialistas preferem analisar o que dizem as direcções dos vários partidos, os comentários do vizinho, os seus próprios desejos, do que esta coisa básica e determinante — a situação económica.

A situação da crise económica que deu origem ao 25 de Abril não parou nesta data. Aprofundou-se.

A crise económica portuguesa tem origem no próprio sistema capitalista e portanto não parou quando acabou o fascismo, porque o capitalismo se manteve. Portugal foi um paraíso de mão-de-obra para as indústrias do imperialismo que só se mantém se a sujeição se mantiver. Portugal foi um país cuja indústria nacional se desenvolveu à custa da «mama» das colónias, fonte de matéria-prima barata e compradores certos e coagidos fosse qual fosse a qualidade. Fruto de tudo isso, e ainda mais da emigração, Portugal voltou costas à agricultura e gasta hoje 26 milhões de contos por ano em compras de produtos alimentares.

Aqui está um produto acabado do imperialismo, aqui está uma monstruosidade fabricada pelo sistema capitalista.

A sua crise, para além da crise do capitalismo à escala mundial, durará enquanto aqui durar o sistema.

Não é portanto com cravos nem com liberdades que a crise se remedeia. As liberdades permitiram a organização dos trabalhadores e a conquista de muitos direitos. Mas não resolveram a questão da crise económica, nem do poder, nem do programa revolucionário.

E, das duas uma: ou a revolução socialista se faz e, tomado o poder pelos trabalhadores, procuraremos outros caminhos e outras soluções que destruam a estrutura capitalista; ou o capitalismo se firmará aqui sob a forma fascista. E, se dizemos que se vai firmar aqui sob a forma fascista não é porque pensemos que Freitas do Amaral é uma hidra mal-cheirosa que não pensa noutra coisa desde pequenino do que rebolar-se de gozo por ter de confessar ao padre que mandou torturar nessa semana trezentos trabalhadores... Ou porque o Spínola sonha consigo próprio de monóculo e sobretudo de pele, ordenando o fuzilamento de três mil antifascistas. Mas porque o sistema capitalista no sistema actual não tem outra solução senão o fascismo. O desenvolvimento do capitalismo aqui só se pode fazer à custa duma exploração que mantenha os salários ao nível da fome. E para os manter ao nível da fome precisa duma mão de ferro, que esmague os trabalhadores. O aumento do custo de vida reduzirá as regalias conquistadas a zero; e para conter as vagas de explorados que gritarão contra a miséria, o capitalismo vai necessitar de levar a repressão tão longe quanto necessário.

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Não é portanto por a burguesia ter aqui os seus monstros domésticos, os Spínolas, os Freitas do Amaral, que fará o fascismo. A burguesia, para exercer o poder, prefere a face simpática dum Olof Palme, ao terror de um Pinochet. Mas sempre que é necessário utiliza um Pinochet.

As condições da situação económica não vão pois permitir uma democracia burguesa. Ou vamos para a revolução socialista ou o fascismo virá. E nada de ter esperanças que a situação de impasse continue! Gastaram-se as divisas; estamos agora a roer as reservas de ouro.

Foi por fazermos esta análise que há um ano e meio colocámos um cartaz que ficou na memória: UMA SÓ SOLUÇÃO, REVOLUÇÃO SOCIALISTA. Nessa altura, um dos sete membros da então Comissão Coordenadora do MFA perguntou-nos delicadamente donde tinha vindo o dinheiro para tal cartaz... Porque, claro, ouvira comentar que só provocadores poderiam falar em Revolução Socialista. Quanto ao dinheiro, explicámos, e quanto à Revolução Socialista, veio-se a generalizar de tal modo que falar nela passou a ser moeda corrente.

Há alguns meses que esperamos preocupados, que o mesmo se passe em relação à insurreição armada.

SE O DILEMA É — REVOLUÇÃO SOCIALISTA OU FASCISMO — O QUE FAZER?

Parece-nos que a resposta é óbvia — a revolução socialista. No entanto, nós observamos que algumas organizações que aceitam a análise feita atrás esquecem-na quando se trata de encontrarem uma táctica. Disseram-nos por exemplo, que era importante concorrer às legislativas, porque se se conseguisse meter um candidato, sempre ficava lá durante quatro anos... Quer dizer que acreditam que isto se aguenta durante quatro anos em democracia burguesa! É o que se chama ficar cego à análise da situação, para não ser obrigado a tirar as respectivas consequências práticas.

Porque as consequências práticas são duras, são difíceis de executar. Há dois anos que a tomada do poder está na ordem do dia, há dois anos que as movimentações operárias chegam (mesmo fisicamente) às portas do poder, há dois anos que a organização autónoma dos trabalhadores cresce como só aconteceu nos momentos mais revolucionários da História, há dois anos que o aparelho de Estado da burguesia se esfrangalhou. Mas para os trabalhadores tomarem o poder é necessário que estejam armados, é necessário que haja um plano e um programa, é necessário que haja uma direcção político-militar. É isso que as organizações têm recusado. É esse passo que não quiseram nem querem dar. Porque esse passo significa para elas um abismo. Porque entregar armas aos trabalhadores, realmente conquistar o poder para os trabalhadores, realmente, significa perder a liderança das massas, significa ficar diluído, entregue à democracia da assembleia de trabalhadores, à direcção soviética. Significa perder privilégios. Significa o destruir de estruturas que, bem ou mal, são as que se dominam e ficar perante o desconhecido, obrigado a construir tudo de novo. É por isso que as organizações e os militantes que se dizem revolucionários, dão meia volta, disfarçam e começam a falar nos quatro anos de assembleia legislativa.

Haverá aí quem conheça a forma desta situação económica aguentar um regime de meias-tintas, sem fascismo, durante algum tempo, de modo a que se organiza mais e melhor o proletariado? Se há, que diga. Se não, vamos mas é encontrar um programa revolucionário para um poder revolucionário. E até já temos uma plataforma de entendimento, aceite por larga unidade — o projecto de trabalho do Copcon.

Haverá aí quem saiba outro processo para uma classe tomar o poder a outra que não seja pela força? Se há, que diga. Se não, vamos organizar-nos para a tomada do poder em termos de força.

Haverá aí quem conheça uma magia que permita a homens desarmados vencer homens armados? Se há, que diga ou que venda a fórmula. Se não, vamos todos falar a sério no armamento dos trabalhadores.

Claro que quando dizemos isto sabemos que os nossos amigos «sensatos» murmuram: «lá estão eles, triunfalistas, aventureiros, esquerdistas!»

E muito sensatamente, vão urdindo a sua teia de palavras, atamancando as contradições, puxando para trás, contrariando a revolução.

Afinal é Spínola que é mais realista. Como sempre acontece, a burguesia não se perde em devaneios; conhece as suas necessidades, procura satisfazê-las. Spínola e os seus homens sabem que a situação não se estabiliza tal como está. Sabem que são necessárias «condições técnicas» (como ele diz) para o «exercício da democracia» (leia-se fascismo). Sabem que necessitam de instaurar aqui um regime altamente repressivo. Por isso se preparam para um golpe de direita. Por isso encomendam o número x de armas para o número y de homens. Duma forma precisa, prática, sem rodeios. Olhem se alguma vez o Spínola diz que a burguesia «ainda não está preparada» ou precisa de «amadurecer» para pensar num poder autoritário... Olhem se se consola com a ideia de que o Galvão de Melo esbracejando na assembleia talvez aguente as coisas.

AS TEORIAS E OS MEDOS

Estas posições recuadas das organizações revolucionárias que deviam estar na vanguarda, foram e são um factor importante para o atraso do processo revolucionário.

As organizações maoístas foram-nos enchendo o ouvido com a sua «teoria» Pobre teoria, pois que tal chamam ao papaguear dos textos clássicos, à análise idealista dos partidos comunistas tradicionais, à repetição dos «clichés» pré-estabelecidos (como o próprio Mao Tsé Tung tão bem criticava... nos seus tempos de revolucionário). Os trotskistas, esses, limitam-se a ir catando a história e sabem de cor as doenças que o Lenine e o Trotsky tiveram em pequenos e quantas vezes é que o Staline bateu na mulher... Mas acontece que nem uns nem outros teorizam realmente, isto é, não fazem teoria a partir da nossa realidade e da nossa prática. Há congressos inteiros de organizações maoístas que se passam sem que a realidade portuguesa seja examinada.

E sempre que o poder estremeceu, sempre que os trabalhadores vieram para a rua, em termos de «ou vai ou racha!» houve sempre organizações maoístas que se encarregaram de puxar para trás, em nome do «amadurecimento», em nome das «massas ainda não estarem preparadas», em nome da necessidade do «verdadeiro partido». Contaram-nos que mesmo no final de Setembro, em pleno Palácio Foz, alguns dirigentes maoístas estiveram para serem atirados pela janela, quando, perante o multidão de trabalhadores que vieram para a rua dispostos a tudo em protesto pela ocupação das rádios e que dali queria avançar para S. Bento e Belém, meteram travões a fundo e apelaram para o «bom senso dos oficiais» presentes, implorando-lhes que não avançassem para a tomada do poder... Momentos inesquecíveis esses, para quem agora vê o fascismo a avançar e para quem sabe que é tudo mil vezes mais difícil do que nesse momento! Mas para eles a única coisa que conta é que se andou mais seis meses para a «construção do partido», mesmo que pelo meio tenha acontecido o 25 de Novembro.

Mas outros há que compreendem que a análise desemboca na insurreição, mas que tudo o que os preocupa é encontrar argumentos para provar que a derrota é certa. A falta de esclarecimento das populações do Norte, o avanço do fascismo, a influência do reformismo em muitos meios operários, a debilidade das organizações revolucionárias, a debilidade do Poder Popular, as dificuldades do PRP, tudo isso são argumentos que nos chovem em cima deitados por todos aqueles que querem encontrar razões para não fazer a revolução. E será que nós não aceitamos essas verdades? Claro que aceitamos. E será que não sabemos que a insurreição tem muitas possibilidades de ser derrotada? Claro que sabemos.

Mas se a insurreição tiver algumas probabilidades de sair vitoriosa, então não há mais do que arriscar. Porque a outra alternativa é o fascismo.

Se o proletariado e os revolucionários vão ser esmagados pelo fascismo, então que escolham o único caminho por onde podem não sê-lo, por onde podem ter a possibilidade de ser eles a vencer. Não há mais nenhuma saída; escusam os medrosos de tentar correr para trás na História.

Organizar a insurreição não é ter a certeza de a ganhar, é ter a necessidade de a fazer. Para ganhar ou para perder. Isto de se fazer a revolução é um negócio que nunca dá garantias.

Mas para aqueles que sabem que o confronto é inevitável, o caminho é a organização para a tomada do poder. A organização dos trabalhadores numa base unitária e apartidária, a organização da classe operária nas suas empresas, a organização dos trabalhadores do campo, a organização dos soldados, dos marinheiros e dos oficiais revolucionários. Da organização (hoje clandestina) dos quartéis e da organização nos locais de trabalho e habitação, nascerão hoje de novo as forças que se hão-de conjugar para, confrontando-se violentamente com a burguesia, darem expressão ao próprio sentimento das massas (veja-se os confrontos com o PPD e o CDS durante as eleições) barrarem o caminho ao fascismo e instaurarem um poder dos trabalhadores, acabando de vez com o sistema capitalista no nosso país.


Inclusão: 08/04/2020