Aspiração

Agostinho Neto


HTML: Fernando A. S. Araújo


Ainda o meu canto dolente
e a minha tristeza
no Congo, na Geórgia, no Amazonas

Ainda
o meu sonho de batuque em noites de luar

Ainda os meus braços
ainda os meus olhos
ainda os meus gritos.

Ainda o dorso vergastado
o coração abandonado
a alma entregue à fé
ainda a dúvida.

E sobre os meus cantos
os meus sonhos
os meus olhos
os meus gritos
sobre o meu mundo isolado
o tempo parado.

Ainda o meu espírito
ainda o quissange
a marimba
a viola
o saxofone
ainda os meus ritmos de ritual orgíaco.

Ainda a minha vida
oferecida à Vida.
ainda o meu desejo.

Ainda o meu sonho
o meu grito
o meu braço
a sustentar o meu Querer.

E nas sanzalas
nas casas
nos subúrbios das cidades
para lá das linhas
nos recantos escuros das casas ricas
onde os negros murmuram: ainda

O meu Desejo
transformado em força
inspirando as consciêcias desesperadas.


Inclusão 05/11/2016